O mundo submarino da Antártida esconde segredos que, por muito tempo, permaneceram intocados. Entre essas maravilhas, a Gonatus antarcticus, uma lula raríssima, destaca-se como um verdadeiro enigma dos mares gelados. Depois de anos de especulação sobre sua existência, a comunidade científica finalmente conseguiu filmar a lula viva em seu habitat natural, e a descoberta aconteceu de forma surpreendente no Natal do ano passado.
No dia 25 de dezembro de 2022, uma equipe de pesquisadores do Schmidt Ocean Institute estava a bordo do revolucionário navio de pesquisa MV Falkor, navegando nas águas do Mar de Weddell. Após um dia anterior frustrante, em que tentaram sem sucesso testar um veículo submarino remotamente operado devido ao movimento intenso do gelo marinho, eles decidiram voltar a uma nova localidade. A esperança era alta quando reentraram na Bacia de Powell, uma vastidão abissal de 3.000 metros de profundidade.
Foi neste cenário desafiador que a magia aconteceu. Enquanto o veículo conhecido como SuBastian descia a profundidades consideráveis de 2.137 metros, algo inesperado cruzou o seu caminho. O pesquisador Manuel Novillo, que acompanhava as gravações, rapidamente solicitou ao piloto que se aproximasse de um misterioso animal que havia acabado de surgir nas telas.

Lula rara capturada por acaso
O retorno à Bacia de Powell não foi apenas um ato de ressurgimento, mas sobretudo uma reviravolta no destino dos pesquisadores. Assim que o SuBastian começou a filmar, um espetáculo notável começou a se desenrolar diante das câmeras. A lula, ao perceber a presença do veículo, liberou uma nuvem de tinta esverdeada, um claro sinal de defesa, mas optou por permanecer flutuando na água por alguns minutos, permitindo que a equipe realizasse medições e observações.
O vídeo capturado não apenas conseguiu registrar a aparição do animal, mas também revelou suas dimensões: quase um metro de comprimento. Depois de revisar as filmagens, os pesquisadores compartilharam a descoberta com Kat Bolstad, a renomada especialista em cefalópodes da Universidade de Tecnologia de Auckland, que prontamente identificou a lula como sendo a Gonatus antarcticus.
Segundo um artigo publicado pela National Geographic, este registro marca a primeira vez que a lula foi vista viva em seu habitat natural, um feito monumental para a biologia marinha.

Uma descoberta inovadora
Embora a Gonatus antarcticus já fosse bem conhecida através de análises de carcaças encontradas em redes de pesca e nos estômagos de predadores, a observação de um espécime vivo inaugura uma nova era de conhecimento sobre a espécie. Com as imagens disponíveis, Bolstad e o professor Alex Hayward, da Universidade de Exeter, que não participou da expedição, ofereceram novas insights sobre a biologia e comportamento da lula:
- Os ganchos localizados em seus tentáculos têm a função de capturar e dominar presas, revelando a natureza predatória do animal.
- O estilo de vida da G. antarcticus combina a caça ativa de peixes e a evasão de predadores mais agressivos, uma estratégia de sobrevivência complexa.
- A lula exibia cicatrizes visíveis ao longo de seu corpo, o que sugere que ela sobreviveu a um ataque recente de um predador, evocando questionamentos sobre a dinâmica dos ecossistemas marinhos.
- Infelizmente, a equipe não conseguiu determinar o sexo do espécime filmado, deixando em aberto novas questões para investigações futuras.
A descoberta da Gonatus antarcticus viva não só marca um triunfo para a biologia marinha, mas também sublinha a importância de iniciativas de pesquisa e tecnologia que ampliam nosso entendimento sobre as criaturas que habitam as profundezas do oceano. Em um mundo onde a exploração marinha é cada vez mais crucial, essa filmagem representa apenas o início de um novo capítulo na relação da humanidade com os vastos mares do planeta.